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HISTÓRIA E PERFORMANCES CULTURAIS: LINGUAGENS E ESTÉTICA EM REPRESENTAÇÕES SOBRE O AUTORITARISMO EM PERÍODOS DITATORIAIS NO BRASIL
2023/2 até 2026/1
ESCOLA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES E HUMANIDADES
CULTURA, PODER E REPRESENTAÇÕES
CULTURA E LINGUAGENS
EDUARDO JOSE REINATO
OBJETIVOS
2.1.Objetivo Geral :
O objetivo geral do projeto HISTÓRIA E PERFORMANCES CULTURAIS: LINGUAGENS E ESTÉTICA EM REPRESENTAÇÕES SOBRE O AUTORITARISMO EM PERÍODOS DITATORIAIS NO BRASIL é o de estimular reflexões multidisciplinares em relação à pesquisa histórica com as Performances Culturais e as linguagens artísticas em geral. Essa perspectiva, por um lado, propiciará que sejam revisitadas as tradições artísticas e culturais que fundamentaram a maneira pela qual as sociedades, e a brasileira em específico, concebem, compreendem e usufruem do objeto das relações surgidas do ato Performático. De outro lado, possibilitará a ampliação do horizonte estético dos futuros historiadores, bem como suscitará um redimensionamento da perspectiva histórica por parte de futuros artistas e teóricos das artes.
2.2. Objetivos Específicos
Ao tratar de fontes, é necessário proceder ao método histórico, primeiramente arrolando e selecionando as obras a serem utilizadas para a realização da pesquisa; avaliando os testemunhos e informações expressos pelos autores; finalizando a análise e crítica dos documentos com a interpretação hermenêutica. Em seguida, realizar-se-á a síntese, confrontando as informações levantadas com hipóteses e objetivos formulados previamente. O documento histórico é para o pesquisador de Performances Culturais e para o Historiador uma construção. Assim, o trato com os documentos é o resultado da produção e apropriação pelos homens condicionados por seu tempo histórico, por seu lugar no mundo. O corpus documental principal dessa proposta de trabalho serão as obras de Cartunistas como Belmonte, Henfil, Glauco e Spacca e eventualmente, autores que contribuíram para o Pasquim. Só o Pasquim daria um belo plano de trabalho de iniciação científica para alunos. Mas faremos uma pequena aproximação a essa fonte para depois elaborarmos uma proposta de pesquisa mais densa, que poderá ser um subprojeto deste que agora apresentamos.
Adotaremos uma postura em relação ao documento que significa identifica-lo como objeto e sujeito de sua temporalidade, e portanto, não significando que ele se explique por si mesmo. Dessa maneira, tal postura metódica fundamenta a necessidade de interlocução entre vários documentos históricos e diferentes temporalidades. Assim, uma coisa é entendermos a produção de Belmonte no idos de 1936 a 1946. Outra será a de analisar as charges do ano de 1989 de Glauco e Spacca no Jornal Folha de São Paulo. E ainda, outra perspectiva será trabalharmos com as várias caricaturas publicadas no Pasquim visando observar a elaboração de uma linguagem de resistência à Ditadura Militar dos anos 60 e 70.
Ao se valorizar a especificidade do documento selecionado e construído, deve-se também se ater à relação entre passado e presente, elemento relevância extrema para o historiador, pois em concordância com nosso referencial teórico, não há trabalho historiográfico sem diálogos constantes com o presente. Isto vem na lógica da tese benjaminiana de que não se pode renuncia a qualquer conceito de presente que não se tenha por pressuposto de que esse presente n]ao seja transição. Nesse aspecto, o passado está sempre pronto a ser recuperado por um presente vivo e audacioso que permite-nos definir a própria razão de ser de se pesquisar o passado e retirar dali, forças, ações, experiências e lutas dos agentes sociais de outros tempos. Assim, a razão de voltarmos a buscar essas pesquisas implica necessariamente no pensar um paradoxo vivido pelo Brasil pós golpe de 2016, qual seja: entender o conflito entre Democratização e “desdemocratização” do Brasil. As charges e quadrinhos servirão como fonte para pensarmos o confronto de contrários seja em um processo de democratização, seja num processo de experiência democrática e experimentação de construção de ações que visam a desdemocratização do país, como temos acompanhado desde o surgimento de uma nova direita, a partir de 2006 e intensificado a partir do ano de 2014.
O contato com o passado é estabelecido por meio de mediações com o presente. Isso implica que não há reencontros imediatos, mas sim um processo reflexivo, que é mediatizado pelo "hoje", ou seja, pelo tempo presente, que está sempre povoado de agoras. Esse processo instaura um procedimento interpretador em que o historiador e seu próprio tempo não podem ser entendidos como entidades desprovidas de "lugar", ou marcados por uma pretensa "neutralidade" diante da análise do passado, mas, ao contrário, inseridos enquanto sujeitos da própria pesquisa.
Para trilhar essa premissa, é necessário levar em consideração a complexidade que envolve o ofício do Historiador, conforme analisado por Carlos Alberto Vesentini em "A Teia do Fato". Nesta obra, o autor deixa claro que o pesquisador não é um interpretador opinativo, isento daquilo que já transcorreu. Pelo contrário, o historiador é o receptor de toda uma tradição do passado que percorre caminhos amplos e difusos. Vesentini chama a atenção para as vicissitudes que marcam a atividade de retomar o passado e destaca que o historiador não é independente em relação ao herdado.
Como bem destaca Vesentini, o fato é constituído por determinada transubstanciação e, portanto, tende a transparecer, no tempo, como produto e significação de e para um pretenso geral. Isso significa que o fato histórico torna-se mais uma das vias da herança a nós imposta por um passado instituidor. Em outras palavras, o passado é sempre interpretado a partir do presente, e o historiador é um sujeito ativo nessa construção, que é influenciado por sua própria época e tradição historiográfica. Portanto, é fundamental reconhecer a importância das mediações entre passado e presente na construção do conhecimento histórico.[1]
É fundamental reconhecer que a relação entre passado e presente não pode ser desvinculada do ato de recuperar o passado. Essa conexão garante a inserção do sujeito pesquisador no interior da pesquisa e torna os elementos de outro tempo capazes de atuar vivamente entre nós. Essa ideia está presente em todo o projeto, assim como as reflexões densas de Walter Benjamin e Carlos Alberto Vesentini, que contribuem de maneira efetiva para a metodologia de pesquisa adotada.
A utilização de imagens como fontes de pesquisa, especialmente as charges ou caricaturas, apresenta uma particularidade que merece ser observada. Essas imagens permitem não apenas a avaliação das concepções estéticas das mesmas, mas também das inovações estilísticas apresentadas pelos sujeitos sociais envolvidos em suas produções e recepções. Isso ocorre porque as charges são frequentemente utilizadas como instrumento de crítica social e política, refletindo as ideias e valores de uma determinada época. Dessa forma, ao analisarmos essas imagens, somos capazes de compreender melhor as complexidades e nuances das concepções estéticas e políticas que permeiam o contexto histórico em questão.
Além disso, as charges também são reveladoras de determinadas concepções estéticas, muitas vezes associadas a uma concepção política e social específica. Por meio da análise dessas imagens, podemos identificar os valores e ideias presentes na sociedade e como eles se manifestam nas artes visuais. É importante ressaltar ainda que as charges podem revelar nuances da "aura" construída em um momento específico da representação artística, fornecendo informações valiosas para a pesquisa em questão e contribuindo para uma compreensão mais aprofundada do contexto histórico e social em que foram produzidas. Para isso é necessário se levar em consideração as características metodológicas que dizem respeito à relação representações e História.
É importante enfatizar que o material iconográfico não deve ser considerado como uma representação fiel e objetiva da realidade, mas sim como uma interpretação subjetiva e mediada do artista que o criou. Dessa forma, quando o historiador utiliza imagens como fonte de pesquisa, é necessário ter em mente que o passado chega até ele através de uma seleção e interpretação realizada pelo caricaturista ou chargista. Em outras palavras, as imagens não são meros reflexos da realidade, mas sim uma mediação do olhar do artista por trás delas.
Por essa razão, o material iconográfico pode ser visto como uma fonte rica em informações estéticas e ideológicas, que refletem não apenas a visão do artista, mas também a época e o contexto social em que foram produzidas. Dessa forma, a análise cuidadosa dessas imagens pode revelar muito sobre as crenças, valores e atitudes da sociedade da época.
No entanto, é preciso ter em mente que as imagens são apenas uma representação parcial e limitada da realidade, selecionando e organizando visualmente fragmentos específicos do mundo em que vivemos. Por isso, é importante que o historiador esteja atento às escolhas estéticas e ideológicas do artista por trás da imagem, a fim de compreender melhor o contexto em que foi produzida e evitar interpretações equivocadas.”[2]
Ao analisar as charges ou caricaturas como agentes de seu momento histórico, é importante lembrar que elas não são meras representações objetivas da realidade, mas sim seleções subjetivas e ideologicamente mediadas de como o artista viu e interpretou os eventos retratados. Essa seleção e interpretação pode ser vista como uma forma de escolher o que lembrar e o que esquecer, aproximando-se do recorte conceitual da discussão memória/esquecimento. Nesse sentido, cabe à pesquisa problematizar o documento iconográfico de acordo com suas peculiaridades, evitando a armadilha de assumir que a representação visual nos mostra o que realmente aconteceu. Ao considerar esses aspectos, a análise da charge ou caricatura como fonte de pesquisa pode revelar informações valiosas e proporcionar uma compreensão mais rica e complexa do passado.
Por outro lado, pode-se dizer que a obra de arte, quando entra em contato com o público, estabelece um conjunto de experiências, relações e práticas sociais. Entre o artista e o receptor não existe uma relação predeterminada, mas sim um processo amplo e fluido, em que são construídas validades, demonstrando que as obras não têm um sentido determinado a priori e, por isso, único. Entre os historiadores que fazem da recepção um campo de pesquisa, cabe destacar a presença marcante de Roger Chartier, que afirma que as obras são investidas de significações plurais e móveis, construídas na negociação plurais e móveis, construídas na negociação entre uma proposição e uma recepção, no encontro entre as formas e os motivos que lhes dão sua estrutura e as competências ou as expectativas dos públicos que delas se apropriam.[3]
As proposições apresentadas por Chartier, ao lado dos temas e questionamentos propostos pelo nosso trabalho, permitem que se consiga refletir historicamente sobre a composição das Performances Culturais. Desse ponto de vista, isso significa recuperar a dimensão histórica e cultural inerente a toda atividade humana e, por intermédio dessa, entender as significações e apropriações que as peças teatrais receberam por aqueles que as selecionaram, as concepções cênicas que receberam e a recepção (crítica e público) à luz da historicidade constituinte da própria linguagem artística que envolve a produção de charges e caricaturas .
Por fim, é importante destacar que este projeto de pesquisa se baseia em uma prática metodológica rigorosa, que envolve a realização de um levantamento bibliográfico minucioso e a compreensão aprofundada dos textos selecionados. Além disso, a sistematização crítica do material coletado é uma etapa fundamental do processo de pesquisa, permitindo uma análise consistente e fundamentada dos dados obtidos. A abordagem metodológica adotada busca garantir a validade e a confiabilidade dos resultados obtidos, bem como a contribuição para a ampliação do conhecimento sobre o tema em questão.. Em outros termos:
1) Confeccionar arquivos temáticos com referência completa do(s) autor(es), segundo as normas da ABNT; além do conteúdo da fonte, buscando definir e delimitar o assunto;
2) Organizar e sistematizar a documentação recolhida;
3) Realizar o MAPEAMENTO das caricaturas e charges num contexto cronológico;
4) Fazer fichamentos das críticas aos autores, caso existam;
5) Fazer levantamentos temáticos e bibliográficos sobre as referências teóricas e estéticas no que concerne à relação entre quadrinhos, charges, caricaturas e a produção histórica do riso através da produção gráfica;
6) Articular o debate teórico que orienta a pesquisa com as conclusões advindas da sistematização da documentação;
7) Análise material iconográfico, especialmente em relação temas, representações das personagens e espaço de representação caricatural.
Assim, diante dos problemas apresentados, como desenvolver o trabalho ora proposto? Objetiva-se, de forma metodológica constituir um diálogo possível, a partir de séries documentais que permitam uma maior inteligibilidade destes em relação ao processo histórico, na sua diversidade temporal.
Tal requisito expõe também um outro dado de extrema significação: o referencial teórico, mobilizado pelo estudioso, na maioria das vezes, inspira possibilidades e pistas, mas é somente no trato com a documentação que o diálogo entre historiador e o momento histórico selecionado viabiliza-se. Sobre essa questão tão delicada, envolvendo o diálogo entre o pesquisador, a documentação e os caminhos teóricos e metodológicos, cabe ressaltar que os historiadores constroem seus procedimentos metodológicos à luz do tema e do material selecionado para o desenvolvimento da pesquisa. Nesse aspecto, talvez, a primeira questão diga respeito ao tratamento do documento no âmbito da tradição historiográfica.
Tradicionalmente, encontram-se três maneiras de construir o diálogo com a documentação. A primeira caracteriza-se por estabelecer a supremacia do documento no desenrolar da pesquisa, isto é, torná-lo voz de autoridade, na medida em que ele expressa a ?verdade dos acontecimentos?. A segunda pode ser qualificada como o procedimento que concede ao pesquisador o controle na produção do conhecimento. Para tanto, as evidências são utilizadas, na maioria das vezes, para corroborar hipóteses e/ou ideias prévias à própria pesquisa. Por fim, a terceira vem a ser a postura metodológica que busca construir uma interação entre o pesquisador e seu corpus documental. Esta perspectiva de trabalho implica em adotar, em primeira instância, uma orientação no tratamento da documentação. Todavia, o desenvolvimento das atividades, o surgimento de novas possibilidades temáticas e documentais não pode e nem deve ser descartado. Pelo contrário, o pesquisador, norteado por seus referenciais teóricos e metodológicos, deve compreender como estratégia de trabalho essa relação dinâmica entre ele e sua documentação. Nessa perspectiva, O documento, pois, não é mais para a história, essa matéria inerte através da qual ela tenta reconstituir o que os homens fizeram ou disseram, o que é passado e o que deixa apenas rastros: ela procura definir, no próprio tecido documental, unidades, conjuntos, séries, relações. [...] Ela é o trabalho e a utilização de uma materialidade documental (livros, textos, narrações, registros, atas, edifícios, instituições, regulamentos, técnicas, objetos, costumes, etc) que apresenta sempre e em toda a parte, em qualquer sociedade, formas de permanências quer espontâneas, quer organizadas.
Em outros termos, o documento deve ser visto como fruto de um determinado momento histórico e das relações sociais inerentes a ele, portanto, inserido nas lutas sociais e políticas de seu tempo. Ele não possui autonomia explicativa. Pelo contrário, a sua interpretação requer o diálogo com outras referências do período, a fim de que se explicitem as representações, por ele construídas, do processo no qual foi elaborado, assim como sejam reveladas as circunstâncias que o engendraram e os objetivos a que sua existência correspondeu. Nesses termos, as Performances Culturais, tornadas documentos, serão as bases a partir das quais as pesquisas e os resultados delas decorrentes serão construídos.
[1] VESENTINI, Carlos Alberto. A teia do fato: uma proposta de estudo sobre a Memória Histórica. São Paulo: Hucitec, 1997. P. 18
[2] KOSSOY, Boris. Fotografia e História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001, p. 114
[3] CHARTIER, Roger. À Beira da Falésia: a história entre certezas e inquietude. Tradução de Patrícia Chitoni Ramos. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2002, p. 93.
Nome | Função no projeto | Função no Grupo | Tipo de Vínculo | Titulação Nível de Curso |
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EDUARDO JOSE REINATO
Email: eduardoj@pucgoias.edu.br |
Coordenador | Pesquisador | [professor] | [doutor] |