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HISTÓRIAS ENTRELAÇADAS DA AMÉRICA LATINA E DO CARIBE: OS FEMINISMOS DE TERREIROS
2023/1 até 2026/2
ESCOLA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES E HUMANIDADES
MEMÓRIA SOCIAL E SUBJETIVIDADE
Diversidade Cultural, Reconhecimento e subjetividade
THAIS ALVES MARINHO
Investigar ações coletivas de mulheres afrodiaspóricas exercidas no contexto latino americano e caribenho, desde a colonização aos dias atuais, que possam confirmar a noção de Feminismos de Terreiros.
Contribuir para a aplicabilidade dos dispositivos jurídicos de cada país da América Latina e do Caribe de ações afirmativas, como a Lei 10.639/2003, das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana, orientadores da Base Nacional Curricular Comum e a lei da Colômbia.
Observar o protagonismo das mulheres arfrodiaspóricas nas lutas sociais por educação e ações afirmativas
observar a espiritualidade africana (notadamente a Iorubá), enquanto estrutura objetiva, que se incorpora por meio do habitus, e como agenciou essas mulheres negras no contexto diaspórico a atuar para além da delimitação binária de gênero ocidental, até mesmo porque a colonialidade de gênero impossibilita pensar as mulheres negras como gendradas, então isso permitiu a elas maior protagonismo do que às mulheres brancas
Desde a colonização da América e do Caribe um intenso e cruel processo diaspórico foi desencadeado como estratégia de ocupação dos novos territórios invadidos. Africanos e africanas de distintas etnias e nações foram abruptamente arrancados de seus territórios e dos vínculos comunitários e forçados ao doloroso processo do Tráfico negreiro, cujo fim foi a escravidão nas Américas e Caribe. Assim, uma de nossas prerrogativas (MARINHO et all, 2020) é de que diferentes “temporalidades e historicidades foram irreversível e violentamente juntadas” (HALL, 1996, p. 223).
Nesse diapasão é importante observar que não há simetria de poder entre os elementos culturais, religiosos e linguísticos oriundos dos distintos povos que tiveram suas histórias entrelaçadas, mas, vale perspectivar que ao invés de serem vistos como antagônicos, separados e opostos, (como nas epistemologias binárias eurocentradas), tais elementos intraculturais se completam histórica e semanticamente, são “histórias partilhadas” interdependentes e que se apresentam em simultaneidade formando uma “modernidade entrelaçada” (RANDERIA, 2000).
Assim, apesar da imposição de sentidos da missão civilizatória cristã, da violência epistêmica da academia, dos interesses de construção de uma identidade nacional e dos regimes de representações historicamente construídos sobre as mulheres negras há um lócus fragmentado da diferença colonial, conforme analisa Maria Lugónes (2014). Esse lócus fora construído duplamente, para a imposição do gênero binário ocidental, para a hierarquização racializada, a fim de controlar tanto o trabalho, quanto a reprodução de seus corpos, mas que não é suficiente para apagar as resistências, a alteridade, a memória e a tradição dos grupos subalternizados. Logo, as mulheres negras também se relacionam duplamente diante da tensão entre os lados do lócus, são oprimidas e são resistentes, afinal, são entes “densos, relacionais, em socialidades alternativas e alicerçadas nos lugares tensos e criativos da diferença colonial” (LUGÓNES, 2014, p. 942).
Assim, nossa hipótese é de que as mulheres negras (brasileiras e africanas), ainda durante a colonização do Brasil (no contexto diaspórico) se organizaram, ora por meio do próprio catolicismo, como nas irmandades, ora por meio da manutenção da espiritualidade ancestral africana nos terreiros, ou em outras agremiações como ranchos e cordões, e essas ações coletivas possibilitaram a elas “a manutenção de uma coesão que foi perdida ou desarrumada durante o processo de escravização” (MOREIRA, 2011).
Essas redes de sociabilidade, em muitos casos, funcionavam como uma instituição familiar, não ligada à consaguinidade, mas, especialmente, por afinidades culturais e religiosas, que demarcam a constituição de famílias extensivas e papéis de gênero diferentes do modelo de família burguesa “que delega à mulher o espaço do lar, a criação dos filhos e a submissão ao homem, ao trabalho, à subsistência da família e ao poder de iniciativa” (VELLOSO, 1990, p. 211).
Núbia Regina Moreira (2011), na esteira de Ruth Landes (1967) indica que a mulher negra se tornou “a viga mestra da família e da comunidade negra”, especialmente a partir da sua atuação como mães-de-santo, zeladoras, transmissoras e guardiãs das tradições religiosas e culturais, conforme especifica Theodoro (1996). Esse fato, no entanto, parece ter ocorrido também entre as católicas, nas Irmandades, já que em muitos casos, membros pertencentes às casas de Candomblé e Umbanda, se auto-declaram católicos/as, participam e frequentam também das instituições católicas (PRANDI, 2004). Na esteira dessas autoras compreendemos que a atuação da mulher negra, que chefia sua família e cuida da sobrevivência dos seus, especialmente, espiritualmente, já nos séculos XVIII e XIX, nos permite falar em “feminismos de terreiros”, e em afrocatolicismos.
Acreditamos ser possível afirmar na esteira de Lugónes (2012), que essas mulheres negras se engajaram num tipo de feminismo decolonial, pelo potencial de superação da colonialidade de gênero, ao mesmo tempo, implica num tipo de feminismo comunitário, que coletivamente almeja melhores condições de existência para seu gênero cotidianamente. Sugerimos adotarmos um termo diferenciado para pensarmos o tipo de atuação dessas mulheres negras no âmbito da espiritualidade, da família, das atividades laborais, da reprodução (que em função da influência da cosmologia Iorubá, são indissociáveis da espiritualidade), que faça alusão ao espaço ocupado por essas mulheres ao longo do tempo, e que possibilita a territorialização/materialização da memória coletiva que compartilham. Esse lugar seriam os “terreiros”.
Os terreiros são entendidos aqui como espaços de convivência próprios aos negros/as escravizados/as, seja nos arredores das senzalas, irmandades, roças de plantação, acampamentos de mineração, que se estenderam para os alpendres e quintais dos ranchos e cordões de forros/as, quilombolas e negros/as livres, onde realizavam benzeções, celebrações católicas (como as congadas, folias e festejos em celebração aos santos), rituais de candomblé, umbanda e outros, além de conviverem e realizarem parte das atividades laborais domésticas. Assim, seria nos “terreiros”, notadamente, que a superestrutura simbólica de matriz africana, por meio das celebrações, mitos revividos e práticas cotidianas, (incluindo aí a compreensão de gênero), estabelece um elo entre os afro-brasileiros e seu passado africano.
Logo, as mulheres negras ao ocuparem os “terreiros” no labor cotidiano, nas conversas à beira do fogão, durante as preparações das celebrações e dos rituais em si contribuem com a disseminação e materialização do que Segato (2003) chamou de “códex afro-brasileno”, que apontam para a existência de um código fixo em ação por trás das práticas observáveis, uma inscrição críptica que se manifesta todo o tempo no discurso de algumas dessas mulheres. Assim, os terreiros se tornam espaço de territorialização, e de mobilização de ações coletivas e individuais de ajudas mútuas relacionadas às intempéries do racismo e do patriarcado ocidental.
Nossa principal motivação é contribuir para a produção de uma História da América Latina e do Caribe a partir da noção de pluralismo histórico, demonstrando como diferentes agentes sociais entrelaçaram temporalidades, sentidos, significados e símbolos à medida que se deu a colonização do Brasil e toda América Latina e Caribe, formando uma História Entrelaçada. Nosso foco se volta, especialmente, para a atuação de mulheres negras, desde a diáspora aos dias atuais, por serem o grupo mais invisibilizado pela episteme eurocentrada, que até então, dominou a historiografia brasileira. A análise, se inscreve numa perspectiva decolonial, e busca a partir da interseccionalidade entre raça, gênero e classe, realizar levantamento bibliográfico, documental e oral sobre a atuação de mulheres negras ao longo do tempo (passado e presente), a fim de compreender as redes de sociabilidade (para além da consanguinidade) formuladas por mulheres negras, que mobilizaram recursos com uma orientação intencional contra o racismo, o machismo e a desigualdade, nos espaços que elas atuam e/ou atuavam
Nome | Função no projeto | Função no Grupo | Tipo de Vínculo | Titulação Nível de Curso |
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CARLA BEATRIZ MEINERZ
Email: carlameinerz@gmail.com |
Pesquisador | Pesquisador Externo | [externo] | [doutor] |
HERIDAN DE JESUS GUTERRES PAVAO FERREIRA
Email: hjgp.ferreira@ufma.br |
Pesquisador | Pesquisador Externo | [externo] | [doutor] |
JOANICE SANTOS CONCEICAO
Email: JOANICECONCEICAO@GMAIL.COM |
Pesquisador | Pesquisador Externo | [externo] | [doutor] |
LUCIA HELENA OLIVEIRA SILVA
Email: LHO.SILVA@UNESP.BR |
Pesquisador | Pesquisador Externo | [externo] | [doutor] |
ROSINALDA CORREA DA SILVA SIMONI
Email: rosinegra@gmail.com |
Pesquisador | Estudante | [] | [] |
THAIS ALVES MARINHO
Email: thais_marinho@hotmail.com |
Coordenador | Líder | [professor] | [doutor] |