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EDUCAÇÃO SUPERIOR E FORMAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL NO BRASIL E EM PORTUGAL NO CONTEXTO DA CIÊNCIA, CRISE DO CAPITAL E TRANSFORMAÇÕES SOCIETÁRIAS
2023/1 até 2025/2
ESCOLA DE CIÊNCIAS SOCIAIS E DA SAÚDE
GRUPO DE ESTUDOS E PESQUISA EM TEORIA SOCIAL E FUNDAMENTOS DO SERVIÇO SOCIAL
Teoria Social de Marx e Serviço Social
SANDRA DE FARIA
Objetivo Geral
Investigar, em nova análise comparativa, aspectos estratégicos predominantes nas politicas educacionais de Estado do Brasil e Portugal e as repercussões na formação em Serviço Social.
Objetivos Específicos
Analisar as mudanças na formação em Serviço Social no Brasil e em Portugal no contexto da ciência, a crise do capital e as transformações societárias.
Dar continuidades aos estudos empreendidos na cooperação internacional entre o Serviço Social da PUC Goiás e ISMT,
Contribuir com análises sobre os parâmetros de investimento em ciência, produção científica e o reconhecimento internacional, contidos nas politicas de pesquisa e desenvolvimento do Brasil e Portugal.
Ampliar os resultados da pesquisa internacional, com produção de novos artigos e publicação em periódicos qualificados, de âmbito nacional e internacional, na área de Serviço Social.
1– Fundamentos Teórico-conceitual
1.1. Perspectivas histórico-analíticas do objeto de estudo
Na realidade sócio histórica de transição para um padrão de acumulação flexível do capital se configuram as condições para a redução dos serviços em geral e em especial da educação à lógica do mercado, mediante a adoção de estratégias de privatização, (des)regulamentação e de reconfigurações institucionais para se alinharem a contrarreforma do Estado e aos interesses do capital nacional e internacional.
A flexibilização institucional e das modalidades de oferta de cursos na educação superior, sobretudo por meio do ensino à distância (EaD), remete a exigência de se investigar sistematicamente as configurações, dinâmica interna e os vínculos com a mercantilização da educação sobre a égide dos mercados financeiros e de fundos de investimentos. A flexibilidade do currículo e da aprendizagem conforme Kuenzer (2016, p. 3) apresentam-se no discurso pedagógico do regime de acumulação flexível, mais precisamente afirma a estudiosa “a aprendizagem flexível surge como uma das expressões do projeto pedagógico da acumulação flexível, cuja lógica continua sendo a distribuição desigual da educação, porém com uma forma diferenciada”.
No presente projeto de pesquisa, o objeto de pesquisa inscreve-se no contexto de expansão da educação mercantilizada e o enfrentamento das desigualdades sociais pela classe trabalhadora, no contexto de crise do capital e de transformações societárias sob a égide dos ajustes neoliberais e da reestruturação produtiva do capital.
No cenário da educação superior e também da formação profissional em Serviço Social incidem determinações de um processo de proporções inéditas de financeirização e desnacionalização da educação, no qual o desmonte e o desprestígio da universidade pública, via privatização e programas de terceirização, é uma finalidade estratégica associada às medidas regressivas nas políticas públicas de desenvolvimento socioeconômico e no enfrentamento da desigualdade social.
O contexto que emergiu após 1973/1974, evidenciou um esgotamento da chamada “Era de Ouro” (Pós Segunda Guerra), como bem examinou Hobsbawm (1995), manifestaram-se as crises de crescimento econômico nos países centrais e nos países periféricos, assim como, as ofensivas do capital com base nas mudanças tecnológicas e organizacionais.
São transformações que redimensionam e reconfiguram a produção e reprodução da sociedade (NETTO, 1996), compondo-se da reestruturação produtiva do capital, incorporação de inovações da área informacional e as modificações na divisão sócio técnica do trabalho, flexibilização e financeirização da produção econômica, políticas de ajuste econômico neoliberal, desregulamentação das conquistas derivadas do mundo do trabalho e desmonte dos direitos sociais, entre outras determinações que seguem exigindo explicação e compreensão como a formação do precariato e o desemprego estrutural. No âmbito do Estado operam-se reformas e contrarreformas para assegurar o domínio do seu papel de provedor de estruturas para o mercado, com a liberalização de capitais financeiros e privatizações.
Na área da educação as ofensivas do capitalismo são, claramente, direcionadas para o desmantelamento da educação superior como direito social universal, portanto, pública, laica e democrática, fruto e conquista das lutas históricas dos movimentos em defesa da escola pública e de organizações da classe trabalhadora, movendo-se a favor de uma concepção de universidade-empresa, como organização prestadora de serviço, operacional e pulverizada. São mudanças nas finalidades públicas da universidade e consistem em garantir o produtivismo do ethos capitalista e a ciência convertida cada vez mais em inovação e tecnologia, com base na globalização da universidade produtivista.
Os estudos críticos evidenciam as orientações dos organismos internacionais e governos nacionais para a educação superior de diversificação institucional, flexibilidade nas modalidades, organização dos cursos e nos currículos e minimização dos conteúdos da formação. Soma-se ainda a expansão exponencial de instituições privadas e prioridade para o ensino à distância. São estratégias de ampliação na oferta de cursos de uma educação mercantilizada, desnacionalizada e intrincada à lógica da financeirização.
Na educação superior a expansão das instituições privadas se concentrarem em empresas e conformam um mercado educacional, com organização pulverizada e capacidade de atender a interesses corporativos e constituir oligopólios por meio de fusões e pela negociação de suas ações na bolsa de valores (CHAVES, 2010). São organizações e grupos favorecidos pela flexibilidade e (des) regulamentação jurídica e institucional do direito universal à educação e de políticas educacionais públicas. São organizações de mercado legisladas pelo Estado, mas antípodas ao controle social da sociedade. Segundo Chaves (2015, p. 430) “o estímulo à competitividade entre as instituições, direcionando-as para o mercado, com a finalidade de contenção dos gastos públicos, passa a ser a tônica das propostas e projetos dos sucessivos governos neoliberais instalados no mundo do capital”.
Para Chaves trata-se das novas estratégias de acumulação de capital do setor educacional,
É oportuno ressaltar que as novas estratégias de acumulação de capital no setor educacional por meio do mercado de capitais, que se tornaram factíveis para um grupo de Instituições de Ensino Superior - IES mercantis fazem parte das transformações ocorridas no mercado financeiro mundial, a partir dos anos 1970, de liberação e desregulamentação dos fluxos financeiros, da interligação dos mercados, da criação de inovações financeiras (derivativos, securitização, contratos futuros, etc.) e de fundos de investimentos institucionais, que estudiosos denominam de processo de “financeirização”. O fenômeno tomou grandes proporções na economia americana e tornou-se bastante evidente nos países desenvolvidos. (CHAVES, 2016, p. 2).
Estas são algumas das principais condições estratégicas para a formação de um mercado de empresas de ensino privadas, mercantil e de capital aberto, como no Brasil a empresa de ensino superior Kroton (principais marcas: Anhanguera, Unopar e Pitágoras) Estácio, Unip, Laureate (marcas: FMU, Anhembi Morumbi, UniRitter), Cruzeiro do Sul Educacional (Universidade Cruzeiro do Sul, Colégio Alto Padrão), Ser Educacional (marcas: Uni Nassau, Univeritas), Uninove, Anima, Unicesumar, Adtalem Global Education (marcas: Damásio, Ibmec e Wyden). Empresas e grupos internacionais como Laureate Educacion - conglomerado norte americano com inserção em diferentes países.
As configurações de uma universidade operacional-empresarial sintonizada com a lógica do mercado e dos negócios, com os interesses dos grandes grupos privados empresariais mercantis, internacionais e nacionais, resultam de contrarreformas da educação, de ataques privatizantes contra a universidade pública, laica e gratuita e ainda da crescente precarização do trabalho docente e do barateamento de cursos do ensino superior a preços abjetas. Cenário no qual se criam as condições para a desnacionalização da educação e sua desregulamentação, devastadoras da universidade como instituição social, com identidade institucional e finalidade educacional, com ensino, pesquisa, extensão e a aprendizagem significativa para os sujeitos envolvidos na reflexão e na prática acadêmica e social.
Os estudos e a investigação evidenciam que de modo diverso de Portugal, no Brasil são múltiplas as alterações verificadas na legislação com a finalidade de derrubar barreiras constitucionais, jurídicas e sociais e ao mesmo tempo de criação de outras condições legais e institucionais para a expansão de uma educação superior privada e mercantil, de venda massificada de um ensino sem pesquisa e extensão, desprovido de abordagens e dimensões educativas múltiplas e existentes no ato formativo e de aprendizagem.
No segmento da universidade-empresa, a educação é gerida como uma mercadoria de um negócio privado, é suprimida da formação a coexistência entre as possibilidades de uma educação que contempla a formação profissional integral e que valoriza a perspectiva sócio-histórica do conhecimento científico, favorecendo exclusivamente o consumo e a repetição de conteúdos e reprodução de modelos.
Na concepção empresarial de educação, prevalece a ausência e/ou o esvaziamento da referência de uma comunidade acadêmica, os interditos a organização autônoma do movimento estudantil, assim como, a associação de professores e funcionários e as suas lutas trabalhistas, políticas e sociais. Aparentemente, são instituições que funcionam sem crise, conflitos e contradições, ocultando relações e condições de trabalho com base em contratos precários, instáveis e de baixos salários e sem carreira docente e técnico-administrativa. São agencias/empresas esvaziadas de uma institucionalidade acadêmica e sintonizada com os fundamentos epistemológicos produzidos a partir áreas de conhecimento científico e de formação acadêmica, indispensáveis para o desenvolvimento do ethos acadêmico, da ciência, da tecnologia e dos processos de inovação.
São organizações com gestão aparentemente simplificada, mas de fato profundamente autoritária do ponto de vista gerencial e didático pedagógica, sem vínculo territorial, sua lógica mercantil domina a sua atuação a ponto de tipificarem cursos como marcas, alunos como clientes e polo ou sede como franquia. Com lucros associados ao processo de financeirização dos serviços/educação operam por meio das fusões e da formação de oligopólios com grupos estrangeiros.
Quanto ao uso de novas tecnologias da informação e comunicação depreende-se do ensino à distância as suas possibilidades e suas profundas contradições em face ao almejado pela acumulação flexível. Na realidade da educação superior do Brasil, diante da extraordinária expansão nas últimas décadas na oferta de cursos na modalidade à distância pode-se concordar com as problematizações de Kuenzer, sem perder de vista as possibilidades de construir alternativas pedagógicas ao formato dominante na EaD compatível com a educação flexível. Conforme análise,
Na educação à distância, cumpre destacar que ainda predomina a reprodução do pior das aulas presenciais: videoaulas intermináveis, leitura e interpretação de textos com apoio de tutor. As atividades propostas, de modo geral não ultrapassam os níveis mais básicos da taxionomia de competências cognitivas, responsáveis pela reprodução de conhecimentos já construídos para o reconhecimento de fatos ou representações de problemas comuns. Superar este modelo para construir roteiros em educação à distância que conduzam o aluno à compreensão da realidade a partir de sólida formação teórica, desenvolvendo competências cognitivas complexas, demanda um novo esforço dos professores, para o que devem ser adequadamente formados. (KUENZER, 2106, p. 21).
De modo sintético observam-se no cenário que abrange a educação e o desenvolvimento cientifico, no Brasil e em Portugal, também duras consequências, sinalizações e estratégias de mudanças regressivas quanto ao fomento e financiamento da pesquisa e a produção do conhecimento, suporte ao desenvolvimento econômico, social, cultural e tecnológico, base de programas e projetos de formação de recursos humanos altamente qualificados e, em particular, modificam-se as políticas estratégicas de Estado para ciência e tecnologia e sua relação com a soberania nacional.
A educação reduzida e funcional às necessidades do mercado forma sujeitos para manter o sistema de produção, ou seja, gerenciar a máquina produtiva. Uma educação socialista, conforme propõe Mészáros (2008), que de fato proporcione a emancipação humana, evidencia uma estratégia de construir uma estrutura social e uma sociedade diferentes, nas quais são formados sujeitos livres, capazes de construir sua própria história. O propósito, nesse sentido, é a constituição de um sistema educacional que atenda às necessidades de seus usuários. Entretanto, a educação tem enfrentado um conjunto de crises, seja em relação à sua estrutura ou em relação ao seu direcionamento educativo. Mészáros (2008, p. 275) sinaliza que:
[...] a crise atual da educação formal é apenas a ponta do iceberg. O sistema educacional formal da sociedade não pode funcionar tranquilamente se não estiver de acordo com a estrutura educacional geral – isto é, com o sistema específico de “interiorização” efetiva. A crise das instituições educacionais é então indicativa do conjunto de processos dos quais a educação formal é uma parte constitutiva.
A educação tem duas funções sendo a primeira de atender ao funcionamento da economia capitalista; a segunda, a de uma formação cujo propósito é garantir o controle político sobre a sociedade (MÉSZÁROS, 2008).
A concepção de educação com potencial de superar as desigualdades sociais conforme Mészáros (2008) é uma educação que se coloca para além do capital, amparada em um sistema que, de fato, concorra à realização dos objetivos primordiais da educação. As desigualdades sociais e seu conteúdo expropriador são reproduzidas e ampliadas quando se concentram na formação de sujeitos para o mercado, que frequentam cursos aligeirados, muitas vezes sem a possibilidade de outra opção educacional, visto que sua condição de classe trabalhadora não lhe permite ter acesso a uma alternativa de formação.
Ancorada na experiencia de cooperação acadêmico cientifica internacional firmada entre o Serviço Social de Portugal e Brasil, na perspectiva de qualificação acadêmico cientifica e de adensamento de uma concepção socio histórica da profissão, pode-se apreender fatores de mediações que configuram o modelo e a globalização da universidade produtivista.
Nesse sentido, espera-se contribuir com os debates sobre a internacionalização da ciência e o trabalho acadêmico, os modelos e métodos produtivistas centrados em atividades de caráter burocrático, publicação preferencialmente em língua inglesa, exigências do mercado global da pesquisa para obtenção de recursos financeiros, públicos ou de empresas, como fatores, entre outros, indutores da lógica da mercantilização que penetrou as estratégias das políticas públicas para a educação, ciência e tecnologia.
Nome | Função no projeto | Função no Grupo | Tipo de Vínculo | Titulação Nível de Curso |
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MAISA MIRALVA DA SILVA
Email: maisasilva@uol.com.br |
Pesquisador | Pesquisador | [professor] | [doutor] |
SANDRA DE FARIA
Email: sandra.f@pucgoias.edu.br |
Coordenador | Líder | [professor] | [doutor] |