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A PREGAÇÃO PELA ARTE - UM ESTUDO DA OBRA DE CONFALONI COMO VIA PULCHRITUDINIS
2022/1 até 2024/2
ESCOLA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES E HUMANIDADES
GRUPO DE PESQUISA EM RELIGIÃO, CULTURA E SOCIEDADE
CULTURA E SISTEMAS SIMBÓLICOS
ANA KELLY FERREIRA SOUTO
OBJETIVOS GERAIS
I. Compreender e melhor analisar a obra pictórica de Confaloni.
II. Investigar se há relação da produção artística e a sua missão evangelizadora do frei dominicano.
III. Compreender o papel da evangelização pela Via Pulchritudinis, dentro da tradição católica.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
I. investigar e avaliar os limites da obra de Confaloni como arte sacra ou religiosa.
II. Descrever e caracterizar a teologia da beleza em Santo Agostinho.
III. Analisar na teoria de Pierre Bourdieu, como se dá o desenvolvimento do amor pela arte, o processo de educação do gosto estético como condição para a apreciação e reflexão.
CONFALONI, O CARISMA DOMINICANO E A ARTE
Giuseppe Confaloni, nasceu em 23 de janeiro de 1917 na cidade de Grotte di Castro, cidade medieval localizada no alto de uma montanha a 100 quilômetros de Roma. Sua existência é marcada pelas duas grandes guerras, veio ao mundo porque o primeiro marido de sua mãe faleceu na Guerra, possibilitando que essa se casasse com seu cunhado, irmão do falecido marido. Giuseppe foi o primeiro filho casal. Por volta de seis anos de idade, demonstrava interesse em ser padre, a família tinha contato com os dominicanos da região, e com dez anos, seu pai fez um acordo com os religiosos, que custearia seus estudos levando anualmente um carregamento de vinhos. No dia acertado, seu pai o levou até a estação de trem e pediu ao cobrador que fizesse o menino descer na estação de Florença, onde esperavam por ele. A partir deste momento, passou exatamente doze anos sem ter contato com sua família, exceto pelos contatos anuais com seu pai.
Os professores dominicanos perceberam o talento do jovem para o desenho, e como é próprio da ordem estimular o talento nato que percebem em seus alunos, seja ele qual for, sugeriram uma professora de desenho fora do convento. Assim seu dom começou a desenvolver.
Quase toda a valiosa obra pictórica de Frei Nazareno Confaloni versa sobre temas religiosos cristãos, mesmo quando não retrata exatamente uma questão bíblica, ainda assim é possível inferir importantes momentos que expressam as virtudes cristãs. Nas obras aproveita para falar dos carismas religiosos, sobretudo das ordens franciscana e dominicana. A presença de frades, o hábito dessas congregações, paisagens que mostram a simplicidade, a pobreza, o trabalho braçal, denúncias políticas, como a perseguição e tortura de freis no período da década de 1960 no Brasil. Além disso, há também os seus autorretratos, realizados de tempos em tempos, a fim de avaliar a si mesmo, como se acompanhasse sua jornada de artista e pregador.
No livro Frei Confaloni – Via Sacra, Px Silveira relata que o amigo de Confaloni, frei Lourenço Papin, que conviveu com o artista durante 15 anos no convento dominicano de Goiânia, diz que frei Nazareno, optou por exercer sua tarefa evangelizadora, por meio da Via Pulchritudinis, caminho pastoral da evangelização que é percorrido por meio da beleza, cultivada em sua obra em doses precisas e certeiras. Isso embora nunca tenha usado a sua arte de forma instrumentalizada em favor da Igreja ou da fé cristã, de forma interesseira ou redutora. O trabalho criativo tem dimensão horizontal, habita um território no qual podemos ver que todo ele foi construído como um ato social, secular e terreno, mesmo que, por vezes, visivelmente extraindo sua força do amor de Deus, diariamente manifestado pelo seu amor. Enfim, conhecer Confaloni “é sentir um pouco mais essa comunhão com o eterno que é a arte; fluidez e fruição da criação”. (PX SILVEIRA, 1991, p. 12)
A arte para o religioso não foi um meio de afirmação social, mas de expressão interior. O ato de pintar era o mais importante, o resto era consequência. Nunca buscou a autopromoção ou o reconhecimento, nem mesmo em simples conversas. Em muitos casos deixou de participar de eventos de competição, não assinou trabalhos, painéis, afrescos, projetos quando julgou ser inadequado com seus princípios. Para ele o sucesso temporal, relativo, passageiro não constituía seu objetivo: “pintar deve ser um exercício diário, ao qual todo artista deve-se entregar por inteiro, sem esperar nada em troca” (SILVEIRA, 1991, p. 70).
Mas se a arte apenas flui em Confaloni sem nenhum objetivo para além dela, o cristianismo também flui no ser do padre Nazareno. Sobre o porquê de pintar suas madonas incompletas, seguiu-se o seguinte diálogo:
- Confaloni, diga-me: por que você faz estas Madonas desse jeito, incompletas e disformes?
- Meu caro, não tente somente enxergar, tente sentir também. Nossos olhos só podem ver realmente quando sentimos. Está aqui o fundamental, para os olhos que sabem ver e sentir. Porque da mesma maneira que eu não posso te fazer ver Deus, não posso também te fazer ver este quadro (SILVEIRA, 1991, p. 84).
Parafraseando PX Silveira, é como um guia que através da beleza da arte nos eleva da beleza sensível, captada pelos olhos, à beleza eterna, fruto do próprio Deus; conduz-nos a descobrir o Criador maior de todas as belezas. A beleza tem a capacidade de alcançar o coração das pessoas e o poder de transmitir a fé, expressar o mistério de Deus e do homem, alcançar o invisível do visível e perguntar quem é o artesão das coisas belas? Isto é, perguntar pela causa primeira?
No século XV Giovano Savonarola, frei dominicano, incentivou a queima de diversos objetos de arte e livros, entendendo que esses eram frutos da mera soberba humana, indignado com os gastos e corrupções dos governantes. Pretendia retomar o sentido da fé católica, no púlpito da igreja de San Marco em Florença, a mesma que marcaria profundamente a arte e a religiosidade de outro frei dominicano, Nazareno Confaloni. Embora não apoiasse nenhuma radicalização política, parece ter retratado o frei Savonarola enforcado, uma alusão a outros freis torturados, em especifico o frei Tito, que foi torturado aqui no Brasil e acabou por se enforcar na Europa. Ao contrário de Savanarola, dessa vez a arte para o dominicano será meio para evangelização, para denúncias sociais e aproximação de Deus (cf. Foto 5, em anexo – a obra retrata os freis executados na forca).
2.2 A PREGAÇÃO PELA VIA PULCHRITUDINIS
Os tempos da renascença italiana passam, e ao final do Concílio Vaticano II, há uma restituição da arte com a Igreja. Na mensagem do Papa Paulo VI aos artistas, afirma: “sois prisioneiros da beleza e que trabalhais para ela: (...) A todos vós, a Igreja do Concílio afirma pela nossa voz: se sois os amigos da autêntica arte, sois nossos amigos”. A carta ainda afirma que a Igreja sempre precisou dos artistas para voltar às pessoas, que artistas e Igreja formam uma fecunda aliança; que as mãos dos artistas devem ser puras e desinteressadas, afastando-se dos gostos efêmeros, indecorosos, e sem valor autêntico. A carta produzida em 1965 apresenta a ideia da beleza e define como a Igreja vê a beleza e a arte, no mundo atual, como uma necessidade para “não cair no desespero. A beleza, como a verdade, é a que traz alegria ao coração dos homens, é este fruto precioso que resiste ao passar do tempo, que une as gerações e as faz comungar na admiração” (PAULO VI, 1965).
Posteriormente João Paulo II em sua Carta aos Artistas afirma que no Gênesis todos são chamados a serem artífices de sua própria vida, devem fazer dela uma obra prima. No caso do artista, ele continua com esse mesmo chamado, porém acrescido da técnica da produção dos objetos de arte. Assim há uma conexão fundamental entre a moral e a arte, “o artista, quando modela uma obra, exprime-se de tal modo a si mesmo que o resultado constitui um reflexo singular do próprio ser, daquilo que ele é e de como o é”. (JOÃO PAULO II, 1999 n 4). Apenas Deus é o criador, mas ao homem cabe ser artífice, e o artista, mais do que os demais, na sua construção artística revela-se a imagem de Deus. Isso porque:
[...] realiza aquela tarefa, em primeiro lugar plasmando a «matéria» estupenda da sua humanidade e depois exercendo um domínio criativo sobre o universo que o circunda. Com amorosa condescendência, o Artista divino transmite uma centelha da sua sabedoria transcendente ao artista humano, chamando-o a partilhar do seu poder criador (JOÃO PAULO II, 1999 n I).
Evidentemente que a arte criativa que alguns homens têm a sorte de ter, não é da mesma natureza que a obra de Deus, mas é comunicação e parte da obra maior realizada pelo pai criador.
Quanto mais consciência possui o artista da dádiva do seu “dom” criador, menos ele pensa em si mesmo e mais direciona seu olhar para contemplar e louvar a Deus e somente assim ele poderá compreender a si mesmo e exercer sua vocação e missão. As obras de artes falam dos seus autores, contam seu íntimo e narram a história de outros homens. É mesmo obrigação do artista talentoso desenvolver e servir a humanidade com sua arte, e a forma sublime de arte é a arte de educar.
A alocução de João Paulo II aos artistas, coloca a beleza como qualificante da arte, coloca em destaque que tudo o que Deus criou é bom, assim também é belo. “A confrontação entre o bom e o belo gera sugestivas reflexões. Em certo sentido, a beleza é a expressão visível do bem, do mesmo modo que o bem é a condição metafísica da beleza” (JOÃO PAULO II, 1999).
Com essas diretrizes acerca do que é arte e a necessidade da perfeição e da beleza, o resultado obtido pelo artífice é comparado com a obra de Deus. Percebe-se que o documento coloca como condição para ser considerada arte a técnica, a moral presente, a representação das coisas elevadas, que conduzem a humanidade por meio do belo ao bem. Qual é a arte a que o documento se refere, fica evidenciada quando destacamos que parte dessa carta, foi retirada da homilia proferida por João Paulo II na solenidade de restauros dos afrescos da capela Sistina em 1994. Reconhece os diversos tipos de artistas, mas ressalva aqueles que com o intuito de promover a fama facilmente ou por outros motivos distanciam-se do papel central da arte que é educar, por meio da beleza e do bem.
No entanto, uma questão que sempre surge quando se trata de arte representativa religiosa, é a proibição no Antigo Testamento, em Deuteronômio 27,15: “Maldito seja o homem que faz ídolo esculpido ou fundido, abominação para Iahweh, obra de artesão”. Porque Ele transcende qualquer representação material, disse Deus a Moises: “Eu sou aquele que é” (Ex 3,14). Por isso, as alocuções papais dedicadas aos artistas, esclarecem que no mistério da encarnação o filho de Deus, nascido de uma mulher tornou-se visível em carne e osso. Assim, temos a partir daí um rosto, que tornou-se o centro da referência para a compreensão do mundo criado, da existência humana e até de Deus. Essa manifestação do Deus mistério, tornou-se estímulo para os cristãos e, dessa forma, a criação artística encontrou espaço para contribuir no crescimento e florescimento da beleza.
As imagens sagradas foram objeto de contendas, porém no Concílio de Niceia, no ano 787, que estabeleceu a legitimidade das imagens e do seu culto, essa ação foi importante para a história, cultura e fé. O argumento decisivo para debelar a controvérsia foi o mistério da Encarnação: se o Filho de Deus entrou no mundo das realidades visíveis, lançando, pela sua humanidade, uma ponte entre o visível e o invisível, é possível imaginar. O fato é que quando se fez homem, “o Filho de Deus introduziu na história da humanidade toda a riqueza evangélica da verdade e do bem e, através dela, pôs a descoberto também uma nova dimensão da beleza: a mensagem evangélica está completamente cheia dela” (JOÃO PAULO II, 1999, n.4).
A partir disso, à luz do Novo Testamento, até mesmo o Antigo Testamento foi reinterpretado e serviu como fonte de inspirações inexauríveis, um tipo de “«dicionário imenso» e de «atlas iconográfico», onde foram beber a cultura e a arte cristã. (...) inúmeras vezes a palavra bíblica se fez imagem, música, poesia, evocando com a linguagem da arte o mistério do «Verbo feito carne» (JOÃO PAULO II, 1999, n.6 – grifos do autor). Essas imagens foram importantes quando muitos não sabiam ler os textos bíblicos. As imagens foram meio para a catequização, na condução de meditações, orações, como forma de buscar as coisas de Deus, mas sobretudo servem para mostrar o mistério insondável que forma o mundo.
A intuição artística autêntica provém da profundidade da alma humana, que ao executar por mais belas que sejam não contemplam o relance vislumbrado pela primeiramente pelos olhos do espírito. Mas ainda assim a arte autêntica ultrapassa o que os sentidos captam, nos conduzindo mais longe em direção a aquele que É. O conhecimento de fé pode ser facilitado pela intuição artística como modelo “eloquente duma contemplação estética que se sublima na fé são, por exemplo, as obras do Beato Fra Angélico”[1], que ao retratar São Francisco de Assis ao receber os estigmas de Cristo, diz, vós sois beleza, contemplava a beleza no belo (JOÃO PAULO II, 1999, n.7).
A arte tornou-se um lugar privilegiado de manifestação de fé através das mais diversas formas: arquitetura, escultura, pintura e música. Neste documento em análise é reportado que no decorrer do tempo ao lado do humanismo cristão, também foi desenvolvido uma forma de humanismo sem Deus, outras vezes, oposto a ele. Por isso, houve um certo distanciamento dos artistas do mundo da fé. João Paulo II, propõe uma nova aliança com os artistas, relembrando Paulo VI: “A Igreja espera dessa colaboração uma renovada «epifania» de beleza para o nosso tempo e respostas adequadas às exigências próprias da comunidade cristã” (JOÃO PAULO II, 1999 – grifos do autor).
Enfim, as alocuções papais concluíram pela imensa importância da literatura, das artes na vida do homem. Por meio disso, podemos ver nossas fraquezas, nossas misérias e alegrias, nos melhorando por meio das artes e construindo um mundo melhor. Assim concluem:
O mundo em que vivemos tem necessidade de beleza para não cair no desespero. A beleza, como a verdade, é a que traz alegria ao coração dos homens, é este fruto precioso que resiste ao passar do tempo, que une as gerações e as faz comungar na admiração (...) Neste mesmo espírito de profunda estima pela beleza, a Constituição sobre a sagrada liturgia Sacrosanctum Concilium lembrou a histórica amizade da Igreja pela arte e, falando mais especificamente da arte sacra, «vértice» da arte religiosa, não hesitou em considerar como «nobre ministério» a atividade dos artistas, quando as suas obras são capazes de refletir de algum modo a beleza infinita de Deus e orientar para Ele a mente dos homens. Também através do seu contributo, o conhecimento de Deus é mais perfeitamente manifestado e a pregação evangélica torna-se mais compreensível ao espírito dos homens (JOÃO PAULO II, 1999 – grifos do autor).
A Igreja precisa das mais diversas formas artísticas para comunicar, expressar a verdade e a doutrina. Por outro lado, os artistas também precisam dela, não somente porque em boa parte dos temas artísticos remetem à religião, mas remetem à religião porque o mistério da encarnação estimula a imaginação, a busca da verdade nos remete a Cristo e é por isso que os artistas precisam da Igreja e dos Evangelhos. Diz o papa:
A beleza é chave do mistério e apelo ao transcendente. É convite a saborear a vida e a sonhar o futuro. Por isso, a beleza das coisas criadas não pode saciar, e suscita aquela arcana saudade de Deus que um enamorado do belo, como S. Agostinho, soube interpretar com expressões incomparáveis: “Tarde Vos amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde Vos amei!” (JOÂO PAULO II, 1999).
O Pontifício Conselho para a Cultura na Assembleia Plenária realizada em 2006, elaborou um documento que constitui um desafio para nossos dias. Fruto das reuniões do dicastério nestes últimos anos, primeiramente em 2002, com o tema: “Transmitir a fé no coração das culturas no novo milênio”. Posteriormente em 2004: “A fé cristã na aurora do novo milênio e o desafio da descrença e da indiferença religiosa”. Tem o objetivo encontrar resposta para um dos maiores problemas que a Igreja enfrenta em sua história: como evangelizar uma sociedade que parece ter aversão ao catolicismo e certa repulsa pelo sobrenatural. Nessa pequena obra há o conceito de educar a fé pela Via Pulchritudinis:
Por isso, é necessário esclarecer o que é e em que consiste a Via Pulchritudinis: de que beleza se trata, que permita transmitir a fé mediante sua capacidade de atingir o coração das pessoas, de exprimir o Mistério de Deus e do homem, de apresentar-se como autêntica “ponte”, espaço livre para caminhar com os homens e mulheres do nosso tempo, que sabem ou aprendem a apreciar o belo, e ajudá-los a encontrar a beleza do Evangelho de Cristo que a Igreja deve, por sua missão, anunciar a todos os homens de boa vontade (...) Percorrer a Via Pulchritudinis implica empenhar-se em educar os jovens para a beleza, ajudá-los a desenvolver o espírito crítico em face da oferta da cultura da mídia e a plasmar sua sensibilidade e seu caráter para elevá-los e conduzi-los a uma real maturidade. A “cultura kitsch” não é característica de um certo medo de sentir-se marginalizado em face de uma profunda transformação? (ASSEMBLEIA DE BISPOS, 2007, p. 35 e 48).
No discurso de 2009, proferido pelo Papa Bento XVI aos artistas, esse afirma que além dos problemas sociais e econômicos, há uma falta de esperança das pessoas nas outras pessoas. Assim, crescem o desespero, a desconfiança e a agressividade, e ao invés de cultivar a beleza, exploram a natureza, os recursos do planeta, para benefício de poucos. Somente a beleza poderá levar o homem a reencontrar o caminho digno e próprio do humano. Bento XVI reitera que a Via Pulchritudinis é um caminho da beleza, que constitui como um caminho estético, de itinerário da fé, de busca teológica. Cita a mística Simone Weil, que afirma que qualquer arte de categoria é por essência religiosa, porque tudo que desperta o sentimento “puro e autêntico da beleza conduz-nos a colher o Tudo no fragmento, o infinito no finito, Deus na História” (BENTO XVI, 2009)
O caminho da beleza parece ser a busca pela via das artes, do belo e nesse percurso há um redescobrimento da essência do homem, da sua substância e da sua finalidade com a qual foi criado por Deus, respeitando o outro, a natureza. Enfim, que a vida humana é busca e movimento para a elevação, que transcende o imediato presente e a arte seria este apelo que nos arrebata para o acesso às coisas divinas, cuja necessidade está cravada em nosso íntimo.
O caminho da beleza responde ao íntimo desejo de felicidade que mora no coração de cada homem. Ela abre horizontes infinitos que forçam o ser humano a sair de si mesmo, da rotina do efêmero instante que passa, a abrir-se ao transcendente e ao Mistério, a desejar, como fim último do seu desejo de felicidade e da sua nostalgia do Absoluto, essa Beleza original que é o próprio Deus, Criador de toda beleza criada. (...) Se a natureza e o cosmo são expressões da Beleza do Criador e introduzem no limiar de um silêncio contemplativo, a criação artística possui a capacidade de evocar o indizível do mistério de Deus. A obra de arte não é a beleza, mas é sua expressão e obedece a cânones, por natureza flutuantes: toda arte é ligada a uma cultura e possui um caráter intrínseco de universalidade. A beleza artística suscita emoções interiores; produz, no silêncio, o arrebatamento e conduz à “saída de si”, ao êxtase (ASSEMBLEIA DE BISPOS, 2007, p. 56-57).
A proposta de evangelização pela via pulchritudinis encontra fundamento nas ideias de Agostinho de Hipona, nele a via estética e a via filosófica são caminhos de conversão e libertação a unidade e ao bem. O caminho de encontro com Deus consiste numa volta a si mesmo e numa constante educação da razão por meio das artes liberais, das virtudes e sobretudo na busca pela beleza. Amamos a beleza porque é bela, ao contemplar a beleza da verdade nos tornamos belo também. Na beleza da criação e nas obras de arte, o supremo artista, autor de todas as coisas, que doando significado as nossas vidas nos alegram e apresenta seu autor.
A ideia de cosmos oriunda dos gregos, é tomada por Santo Agostinho, como totalidade harmônica e bela, na qual o homem e o cosmos formam a unidade, o mundo é compreendido em sua totalidade, natureza, vento, fogo, formas, vida tudo inserido na mesma ordem divina. A ordem é um conceito central para a construção da unidade do cosmos, de Deus e do homem. A via para chegar a essa unidade é a beleza e a filosofia, esse caminho de evangelização ocorre pela educação da razão e dos sentidos para abandonar a estética ordinária das aparências e as coisas do alto que pertencem a verdade, ao bem e a beleza suprema, a Deus, “Tarde Vos amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde Vos amei”. (AGOSTINHO, 1987, p. 243)
No processo de conversão Aurélios Agostinho louvou a Deus e o expressou como beleza eterna, pois para ele não se pode amar algo que não seja belo, “por acaso podemos amar algo que não seja belo”. (AGOSTINHO, 2019. P. 190).
[1] Beato Fra Angélico é um dominicano, considerado o protetor dos artistas, há certa similitude não exatamente do estilo artístico dos dois religiosos artistas, mas, sobretudo no que os move, a fé e a arte. Na tela Metáfora – o homem e a mulher – Confaloni (cf. Foto 7, em anexo) imprime a alma dominicana. A composição e os personagens sugerem a tela “a fuga do Egito” (cf. Foto 6, em anexo) de frei Angélico, o jovem camponês encarna os contrastes de sua época e sobretudo o espírito dominicano que transforma as trevas em luz. O caos em equilíbrio, o humano em divino. Comparando as duas telas encontramos semelhança, na composição dos personagens. Frei Confaloni não se prende nem à paisagem italiana nem às personagens bíblicas, retrata uma paisagem e realidade nossa. No quadro tudo é lento e pesado como o chumbo. Denuncia a vida dura do homem do campo no seu caminhar para sobreviver. Ao mesmo tempo denuncia o privilégio machista do homem cavalgar e a mulher ir a pé – ao contrário do quadro de Fra Angélico (PESQUERO, 1984).
Nome | Função no projeto | Função no Grupo | Tipo de Vínculo | Titulação Nível de Curso |
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ANA KELLY FERREIRA SOUTO
Email: souto-ana@hotmail.com |
Coordenador | Estudante | [professor] | [mestre] |
JOSE REINALDO FELIPE MARTINS FILHO
Email: jreinaldomartins@gmail.com |
Pesquisador | Pesquisador | [professor, externo] | [doutor, doutor] |