390
PARADIPLOMACIA, COMÉRCIO EXTERIOR E DESENVOLVIMENTO REGIONAL: UMA ANÁLISE DAS MISSÕES COMERCIAIS INTERNACIONAIS DO ESTADO DE GOIÁS ENTRE 2011 E 2018
2018/2 até 2020/2
ESCOLA DE DIREITO, NEGÓCIOS E COMUNICAÇÃO
GRUPO DE ESTUDO E PESQUISA EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Política Externa e Desenvolvimento
LEANDRO BERNARDES BORGES
Objetivo Geral
Averiguar os efeitos da atividade paradiplomática empreendida pelo governo de Goiás no período de 2010 a 2018, com ênfase às missões comerciais, através de estudos e métodos técnicos de análise que permitem identificar os impactos para o comércio exterior e para o desenvolvimento socioeconômico regional.
Objetivos Específicos
O sistema internacional contemporâneo é marcado, entre outras características, pelas intensas e variadas formas de interação de atores globais tradicionais com autoridades regionais e locais. Neste contexto, tanto a concepção clássica de diplomacia, como o próprio arranjo estatocêntrico idealizado pelo sistema de Vestefália, veem-se constantemente desafiados e forçados a se adaptar a novas realidades, uma vez que a ideia de relações internacionais realizadas exclusivamente pelos e para os governos centrais torna-se obsoleta.
Diante deste cenário, a prática da paradiplomacia[1] no mundo passou a ser flagrada em praticamente todos os continentes, em maior ou menor grau de descentralização política. Iniciou-se na América do Norte e Europa Ocidental, seguindo posteriormente para a América do Sul e Ásia e, mais recentemente, para a África (APRIGIO, 2016). Nos países europeus, EUA e Canadá, a autonomia internacional e o engajamento comercial de entes subnacionais encontram-se consolidados em setores como comércio exterior, investimentos, promoção de turismo, proteção ambiental, direitos de trabalhadores, segurança humana, entre outros domínios de cunho econômico, social, político e cultural. Já na maioria dos países da América Latina, mais precisamente até o final da década de 1980, a combinação de centralização de poder, militarização das fronteiras, regimes ditatoriais e políticas econômicas protecionistas acanhou a maioria das iniciativas substanciais de cooperação descentralizada por parte de governos estaduais, provinciais e municipais.
O Brasil, particularmente no campo da paradiplomacia, é considerado um caso especial no mundo – até mesmo raro –, por ter experimentado níveis elevados de descentralização política e econômica décadas antes da globalização comercial, produtiva e financeira dos anos 1970[2]. Três momentos distintos de engajamento subnacional podem ser facilmente identificados na história brasileira. Primeiramente, durante a República Velha (1889-1930), período marcado pelo intenso ativismo dos estados brasileiros “nos mercados internacionais de capitais ao captar vultosas somas com a emissão de títulos nas praças financeiras europeias e depois nos Estados Unidos da América” (MAIA; SARAIVA, 2012, p. 106). Posteriormente, entre 1930 e 1983, caracterizado por iniciativas frustradas e/ou praticamente nulas de internacionalização, devido às intempéries externas e domésticas, como a crise financeira global de 1929, a centralização de poder, o forte nacionalismo, o protecionismo de mercado e a elevada capacidade de intervenção do governo brasileiro nas unidades federativas (BUENO, 2010). Por fim, a terceira etapa, período que compreende desde a fase de redemocratização no Brasil e o novo marco constitucional de 1988 até os dias atuais, quando estados e municípios retomam a paradiplomacia de maneira ainda mais intensa do que na Primeira República, impulsionados por uma mistura de descentralização política e fiscal, maior exposição à economia internacional, considerável estabilidade econômica e participação em processos de integração regional (ABREU, 2014).
A participação do estado de Goiás, no que se refere à temática da paradiplomacia, é considerada inexpressiva tanto na primeira fase (Primeira República) quanto na segunda (1930-1983), por apresentar índices significativamente reduzidos em relação aos demais estados brasileiros e à sua receita bruta na época (FRITSCHER; MUSACCHIO; 2009). Por este motivo, o presente projeto enfatizará propositalmente a terceira etapa (de 1984 até os dias atuais), período em que o estado de Goiás assume postura mais incisiva e autônoma nas relações internacionais, atraindo atenções de diversas esferas políticas, econômicas, sociais e acadêmicas.
Apesar de o estado de Goiás não apresentar vocações naturais de interação com o meio internacional (fronteira nacional, litoral, terminais aduaneiros primários, entre outros), os temas que englobam este campo de estudo vêm apresentando níveis acelerados de crescimento nos últimos vinte anos, com nítido destaque para o comércio exterior. Além do acentuado crescimento nos tradicionais índices de exportação e importação do estado, destaca-se também o avanço quantitativo e qualitativo na captação de financiamentos e investimentos para infraestrutura, na cooperação técnica e científica, na área educacional, cultural e ambiental e, sobretudo, na realização de missões comerciais internacionais.
No estado de Goiás, particularmente, as missões comerciais vêm se materializando como uma das principais expressões deste envolvimento internacional. Segundo Lucena, Andrade e Monsueto, as missões comerciais buscam promover estrategicamente setores produtivos regionais para maior inserção, participação e competitividade no mercado internacional e doméstico (LUCENA; ANDRADE; MONSUETO, 2011). Ocorrem geralmente por meio de visitas estruturadas a países estratégicos, regiões de interesse, eventos específicos, clusters[3] ou mesmo empresas, com a finalidade de obter informações técnico-comerciais, parcerias, novos mercados, produtos, processos e tecnologias. Sobretudo, estas missões visam expandir mercado e converter os possíveis benefícios econômicos em melhorias sociais.
É diante deste contexto que a presente proposta de pesquisa almeja responder alguns questionamentos sobre o desempenho de governos subnacionais no meio internacional, com atenção amplificada para as missões comerciais promovidas pelo estado de Goiás entre 2011 e 2018. São eles: em que medida a projeção internacional de governos subnacionais no Brasil configuram ações planejadas do Estado central (proativa e de desejo político consciente) ou, simplesmente, uma reação a eventuais “negligências” político-administrativas da esfera federal com suas unidades federadas, diante de um ambiente social e econômico intensamente interconexo e competitivo? Quais os limites de atuação dos governos subnacionais na arena internacional – e a distribuição de competências entre estes – frente à política externa do governo central e sua diplomacia tradicional? No plano teórico-conceitual, cabe refletir, até que ponto o surgimento de novos atores internacionais, sob o contexto de globalização comercial, produtiva e financeira, abala os conceitos clássicos de Estado, soberania e federalismo ou contribui para a consolidação dos mesmos, considerando que a descentralização política proposta pela paradiplomacia visa transferir novas competências a entidades públicas submissas ao próprio governo central. E, por fim, qual o impacto das missões comerciais coordenadas pelo governo de Goiás entre 2011 e 2018, ocorridas tanto em ambiente doméstico quanto em território internacional, para o comércio exterior e para o desenvolvimento socioeconômico regional?
Acredita-se que uma maior autonomia para atividades internacionais de estados brasileiros – e até mesmo cidades – solidificam bases para uma profunda reestruturação da presença do Brasil no sistema internacional em áreas como comércio, investimentos, processos decisórios, tecnologia, sustentabilidade ambiental e infraestrutura. A presente proposta de pesquisa parte também da hipótese de que a incapacidade do Estado em atender as demandas específicas de suas unidades federativas, de maneira ágil e eficaz, estimula os governos subnacionais a assumirem as rédeas do processo de internacionalização, valorizando interesses e necessidades diversificados, com o propósito de promover o desenvolvimento socioeconômico regional.
A relevância deste trabalho reside, sobretudo, na maneira como pode auxiliar a iniciação científica de alunos de relações internacionais, assim como na constituição de bases de consulta para instituições públicas, classes empresariais e sociedade em geral, interessadas pelos temas que se desdobrarão a partir do tema principal. Ou seja, permite aliar os estudos realizados nos âmbitos do ensino e da pesquisa com atividades voltadas a desenvolver e ampliar a relação transformadora com a sociedade, influenciando soluções concretas para problemas e demandas que conjugam interesses locais, regionais e internacionais, especialmente no campo do comércio exterior e do desenvolvimento. Todavia, a narrativa histórica que acompanha a literatura sobre paradiplomacia – pós década de 1970 –, assim como ocorria com a literatura sobe globalização em seus momentos iniciais, ainda carece tanto de um esquema analítico quanto de uma fundamentação empírica mais abrangente (BUENO, 2012).
[1] Termo atribuído à interação internacional de entidades subnacionais. Ver conceitos no Referencial Teórico.
[2] Sobre globalização comercial, produtiva e financeira, consultar (PRADO, 2001); (GONÇALVES, 1994); (PLIHON, 1995).
[3] O conceito de cluster, neste caso, consiste em cooperação tecnológica no campo da informática.
Nome | Função no projeto | Função no Grupo | Tipo de Vínculo | Titulação Nível de Curso |
---|---|---|---|---|
LEANDRO BERNARDES BORGES
Email: leandrouri@hotmail.com |
Coordenador | Pesquisador | [professor] | [mestre] |