O presente projeto de pesquisa tem o intuito de identificar as estruturas tumulares do século XIX que ainda perduram no Cemitério São Miguel da Cidade de Goiás. A sua fundação em 1858 fez parte das medidas sanitaristas realizadas na cidade para minimizar os odores da putrefação oriundos da prática de enterrar os mortos dentro das igrejas e dos corpos dos enforcados que eram enterrados em valas rasas no campo da forca. Existe, publicada por Moraes (1999), uma planta do cemitério que distribui as áreas deste espaço para as diferentes categorias sociais, incluindo pobres, escravos e acatólicos, considerando a proposta inicial da criação do cemitério, este projeto buscará identificar os túmulos e outras demarcações espaciais que ainda preservem as referências originais desse período. Considerando também, que as ruas e quadras da configuração atual do cemitério se assemelham com a que está registrada na planta do século XIX, pretende-se proceder à análise comparativa das estruturas registrados com a antiga planta do século XIX, buscando verificar se foram executados os propósitos de estabelecer a divisão por categoria social dentro do cemitério. Para atingir os objetivos, serão realizados levantamentos de campo e de documentação histórica. O procedimento da arqueologia para o levantamento das estruturas se assentará em método sistemático não interventivo, por meio de transect, que consiste no caminhamento da área em linha reta para a identificação das informações in situ. O levantamento documental será realizado a partir de fontes primárias e secundárias. Essa pesquisa se volta para a abordagem da paisagem e dos significados simbólicos dentro da arqueologia, e pretende formar um banco de dados digital e de imagens que poderá favorecer a produção de novas análises.

Tem como objetivo geral: identificar representações sócias por meio da cultura material constituída por estruturas funerárias cemiteriais, considerando-a como reflexo não passivo da sociedade. 

Objetivos específicos:

· Utilizar os métodos da arqueologia para o compreender os significados simbólicos da cultura material; 

· Elaborar leitura da cultura material do cemitério a partir do aporte conceitual de representações sociais e os significados simbólicos; 

· Abordar o contexto espacial e o conceito de paisagem a fim de contribuir com a compreensão dos processos de significação do espaço cemiterial; 

· Compreender a formação do cemitério em relação ao contexto histórico de formação da sociedade tradicional.

Este projeto de pesquisa se preocupa com a perda das referências materiais do século XIX que ainda podem ser identificadas no Cemitério São Miguel, constituída por monumentos edificados, lápides, inscrições, iconografias diversas. Apesar de compreender os vestígios materiais como fontes de informação, não tem o propósito de estabelecer uma separação entre a materialidade e a imaterialidade da cultura, entendida como sendo algo indivisível. Considera-se aqui a impossibilidade de isolar os objetos ou estruturas materiais do campo de acesso à memória, à história da sociedade e da vida das pessoas. Estas referências culturais estão também relacionadas às manifestações religiosas, a sentimentos e afetividades que constituem parte da visão de mundo e da identidade local (TELLES, 2010). Fundado em 1958, o cemitério São Miguel constitui-se de um importante marco do empreendimento de melhora da estrutura sanitária do espaço urbano. Sua construção não foi isolada, a necessidade de novas práticas de enterramento vinha sendo pregadas pela categoria médica no Brasil no sentido de afastar os miasmas da morte para fora da cidade (NASCIMENTO, 2013). No período inicial, ou seja, na segunda metade do século XIX, as irmandades ligadas às igrejas exerciam um forte papel no apoio à família do morto para o sepultamento de seus entes, por isso a destinação de quadras específicas para as irmandades. Estas quadras ainda podem ser identificadas no Cemitério São Miguel. Na passagem para o século XX, os túmulos ali encontrados, se destacam por suas representações individuais ou jazigos familiares que remetem à identidade ou aos papéis assumidos em vida, de figuras que se destacaram na história política e social da cidade (LIMA, 1994; ALMEIRA, 2007). Por exemplo, de famílias como Fleury, Caiado, Curado, que tiveram seus representantes políticos, também de artista tais como Veiga Vale e a poetisa Cora Coralina, entre outros (BORGES, Folder). Famílias e pessoas proeminentes dentro da sociedade vilaboense estão ali sepultadas, além disso, pesa a importância histórica da fundação do cemitério, e a importância política da cidade que foi capital da província e posteriormente do estado, apesar de a capital ter sido transferida para Goiânia, manteve-se raízes na antiga Goiás. O valor afetivo e o atributo memorial do cemitério é demonstrado pelo empenho das famílias em remodelar os túmulos de seus ascendentes. O uso e manutenção do espaço cemiterial se constitui dentro de um processo dinâmico, onde os túmulos são remodelados ou algumas vezes os ossos são exumados para dar lugar a novos indivíduos, geralmente familiares. Reformas e novas sepulturas alteram constantemente o aspecto estético do cemitério, levando à perda das referências dos primeiros sepultamentos realizados no século XIX. Da mesma forma que ele é valorizado por sua antiguidade e status social, há a alteração do espaço com reformulação das estruturas tumulares, por isso, restam poucas estruturas originais do século XIX