As infecções fúngicas contribuem significativamente para a morbimortalidade humana, afetando bilhões de pessoas em todo o mundo e resultando na morte de mais de 2,5 milhões de pessoas anualmente. A ameaça de doenças fúngicas não está apenas relacionada ao aumento do número de casos, mas também pela abrangência geográfica e expansões rápidas entre os mais de 300 patógenos fúngicos emergentes. Entre os padrões que mais preocupam os micologistas médicos está o aumento de resistência antifúngica. Este projeto faz parte de uma rede multicêntrica nacional recém-estabelecida para estudar a resistência a antifúngicos como problema de saúde pública, a Rede Nacional de Vigilância Genômica de Resistência a Antifúngicos (ReNaRAn). O nosso foco será em micoses invasivas causadas por fungos presentes no ambiente e que são introduzidas em humanos por vias aéreas ou através de trauma transcutâneo, incluindo micoses primárias (paracoccidioidomicose, histoplasmose, coccidioidomicose, esporotricose, cromoblastomicose e a criptococcose causada por Cryptococcus gattii) e oportunistas (aspergilose e a criptococose causada por C. neoformans). A ReNaRAn tem componentes de pesquisa laboratorial, mas sua base é um projeto de pesquisa com seres humanos descrito neste protocolo. Este projeto de pesquisa com seres humanos está desenhado como um estudo de coorte, com uma etapa retrospectiva e outra prospectiva. Serão incluídos pacientes diagnosticados com uma ou mais das doenças mencionadas acima, em qualquer dos serviços de saúde participantes da rede. Coletaremos destes pacientes dados demográficos, clínicos e de exames complementares a fim de descrever a epidemiologia e o desfecho destas doenças no território nacional. Estas informações serão então correlacionadas com dados genômicos e de susceptibilidade a antifúngicos de isolados clínicos de fungos obtidos de alguns dos participantes, a fim de entender tanto os mecanismos moleculares quanto a prevalência de resistência a antifúngicos no Brasil. Os resultados deste estudo irão fornecer subsídios valiosos para o Ministério da Saúde na formulação de políticas públicas eficazes para o controle e tratamento de infecções fúngicas, além de reforçar as estratégias de monitoramento da resistência a antifúngicos no Brasil.

O objetivo geral do trabalho da ReNaRAn é monitorar a resistência a antifúngicos em casos humanos de micoses sistêmicas no sistema de saúde pública do Brasil. 

Para atingir este objetivo, o trabalho da rede focará em três objetivos específicos: 

1) Estruturar rede de laboratórios de saúde pública e serviços de saúde para detecção de casos de micoses sistêmicas que são foco deste projeto e obtenção de informações dos pacientes e isolados clínicos. 

2) Determinar em laboratório o perfil de susceptibilidade a antifúngicos e as sequências genômicas dos isolados fúngicos, bem como as mutações pontuais ou em nível cromossômico destes patógenos. 

3) Correlacionar as informações clínicas, de susceptibilidade a antifúngicos e genômicas com dados demográficos e de distribuição geográfica para gerar informações úteis para a gestão destas micoses sistêmicas pelos sistemas de saúde pública. Dentro deste trabalho da ReNaRAn, o presente projeto de pesquisa com seres humanos tem como objetivo geral descrever a incidência e o desfecho dos casos de micoses invasivas no Brasil. 

Para atingir este objetivo, iremos focar nos seguintes objetivos específicos: 

1) Detectar casos de micoses invasivas nos serviços de saúde participantes da ReNaRAn. 

2) Coletar sistematicamente dados demográficos e epidemiológicos de cada um desses casos, assim como informações sobre a terapia utilizada e o desfecho. 

3) Organizar informações de-identificadas que serão usadas pelo resto da equipe da ReNaRAn para correlações com sequências genômicas e dados de suscetibilidade a antifúngicos.  

O tratamento de micoses invasivas é prolongado e muitas vezes pouco satisfatório. Recidivas são frequentes, e alguns dos fármacos utilizados são bastante caros ou tóxicos. A resistência a antifúngicos pode tornar esse quadro ainda mais complicado, logo, uma rede multicêntrica que possa explorar melhor as características clínicas e de tratamento de cada uma dessas micoses, bem como entender os perfis de susceptibilidade aos antifúngicos e identificar mutações genômicas que podem estar associadas aos perfis de resistência aos tratamentos, pode fazer grande diferença no tratamento de micoses invasivas. Estudos de susceptibilidade a antifúngicos in vitro e de genômica, como iremos realizar, trazem informações muito importantes. Mas seu impacto é limitado se não há possibilidade de correlacionar os resultados com o desfecho do tratamento em pacientes, uma vez que a expressão clínica da resistência a antifúngicos é a falha terapêutica. Além disso, sem um entendimento da distribuição temporal e espacial dos casos e da demografia das pessoas que ficam doentes, as informações de estudos de resistência a antifúngicos têm menor impacto em saúde pública. Isto torna este projeto de pesquisa com seres humanos muito importante.